entrada: Condições Gerais

Tesouros da Fotografia Portuguesa do Século XIX

2015-04-30
2015-06-28
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Temas e Autores


Carlos Relvas e a Arte Ornamental

Em 1882 Carlos Relvas foi convidado a realizar o registo fotográfico de um dos mais importantes levantamentos do património móvel, efetuado por ocasião da exposição de Arte Ornamental em Londres e depois reorganizada e apresentada em Lisboa, em 1882, sob o título Exposição Retrospectiva de Arte Ornamental Portugueza e Hespanhola. O resultado foi a publicação, em 1883, de um volumoso e importante catálogo, impresso em fototipia, processo a que Carlos Relvas se tinha dedicado de forma empenhada, disputando com José Júlio Rodrigues a sua introdução e aplicação em Portugal. A fototipia é um processo de impressão fotomecânico cujos primeiros desenvolvimentos se devem ao engenheiro químico francês Louis Alphonse Potevin, em 1855, subsequentemente aperfeiçoado pelo fotógrafo alemão Joseph Albert. É um processo de impressão cuja principal novidade era a possibilidade de serem reproduzidas imagens em meios-tons sem marca da trama de impressão, o que conferia grande qualidade estética e técnica às imagens. [E.T.]


Alfredo Keil [1850-1907]

É o único caso, documentalmente conhecido, de um pintor que realizou fotografias, de forma regular, para o estudo de vários quadros da sua autoria, o que nos permite avaliar da influência das duas artes no seu percurso artístico. É o caso de uma das fotografias aqui apresentadas, que evidencia as poses e os estudos de luz para a pintura Leitura de uma Carta (1874), da coleção do MNAC-MC, e que pode ser visitada na exposição permanente. A técnica fotográfica foi explorada pelo pintor não só na relação de escala das figuras, como na atenção que as imagens revelam sobre a natureza da luz. Também no autorretrato, Alfredo Keil, encenou e explorou as facetas da fotografia, como estudos de expressão e de pose. [E.T.]


José Júlio Rodrigues [1843-1893]

Formado em matemática e lente de Química, José Júlio Rodrigues foi um destacado homem da ciência no século XIX português. Entre 1872 e 1879 dirigiu a Secção fotográfica da Direção Geral dos Trabalhos Geodésicos, Topográficos e Geológicos do Reino, cuja missão era o estudo e o registo cartográfico. O álbum aqui apresentado é o resultado das investigações e desenvolvimentos efetuados por J.J. Rodrigues nas aplicações fotomecânicas de impressão da fotografia e que compreendiam os mais modernos processos nesta área, como a fotolitografia, a fotogravura, a fototipografia, a fotolitografia e a fototipia, entre outros. Julgamos, aliás, tratar-se do único exemplar existente em Portugal e até hoje nunca divulgado. É da sua autoria a primeira Carta Geral do Reino (1876) onde utiliza pela primeira vez a fotografia e a sua aplicação científica à cartografia. Em 1874 apresentou na Sociedade Francesa de Fotografia os seus estudos tendo sido premiado. [E.T.]


Calótipo /Papel Salgado

O calótipo é o primeiro processo fotográfico em que foi obtida a fixação duma imagem negativa (o calótipo), permitindo depois a sua reprodução positiva, através do papel salgado. Tanto o processo negativo como o positivo utilizavam o papel encerado como suporte sendo, portanto, de grande fragilidade. Ao contrário do daguerreótipo que depressa se firmou em aplicações mais comerciais, o calótipo, inventado por Henry Fox Talbot (1800-1877), manteve-se como um processo mais vocacionado para a prática artística e de execução mais elitista, já que a sua patente nunca foi tornada de livre utilização pública como o daguerreótipo. A paisagem foi um dos géneros determinantes do calótipo. Frederic William Flower, um comerciante de vinhos inglês, estabelecido no Porto na segunda metade do século XIX, dedicou-se a este processo como amador, sendo da sua autoria a única coleção existente em Portugal, e das raras internacionais, em que o registo de negativos (calótipos) e positivos (papéis salgados) é numeroso e coerente. Mas outros autores foram decisivos na exploração do processo, sobretudo no tocante aos primeiros levantamentos patrimoniais, como os realizados pelo arquiteto e arqueólogo Joaquim Possidónio da Silva (1806-1896), assim como no registo da paisagem urbana, de que são exemplo as obras do pintor e ceramista Wenceslau Cifka (1811-1883). [E.T]


Daguerreótipo

Em Portugal, as primeiras notícias publicadas sobre os primeiros processos fotográficos, o daguerreótipo e o calótipo, datam de Fevereiro e Março de 1839, anunciando desde cedo os trabalhos de ambos os seus inventores, respetivamente Jacques Louis Mandé Daguerre (1787-1851) e Henry Fox Talbot (1800-1877)e as suas repercussões “na arte do desenho”. O daguerreótipo parece ter interessado, desde cedo, ao meio artístico português, que viu nele um progresso de carácter técnico e uma novidade em termos visuais. João Baptista Ribeiro (1790-1868), figura de relevo do ensino das artes e da museologia e o pintor e ceramista Wenceslau Cifka (1811-1883) são dois dos casos hoje documentados, de prática do processo no retrato e na paisagem. Foi um processo de exploração sobretudo comercial e os estúdios de retrato, uma das suas mais importantes aplicações, sendo raras as paisagens obtidas através desta técnica, o que torna o castelo de Sintra de W. Cifka, a única paisagem de Portugal naquele processo, até hoje conhecida. Em Portugal, como no resto do mundo, revolucionou a representação duma burguesia ascendente, permitindo uma massificação do retrato e criando a primeira grande indústria fotográfica, de que os retratos do Conde de Farrobo e segunda esposa são exemplo. Também na sua aplicação científica foi encarado como uma nova possibilidade de conhecimento, datando de 1842 a aquisição pelo Gabinete de Física do equipamento fotográfico (patente nesta exposição) destinado à execução de daguerreótipos dos quais existem ainda hoje oito exemplares no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra. [E.T]


Emílio Biel e o levantamento dos caminhos-de-ferro

Emílio Biel (1838-1915) iniciou-se na fotografia na década de 70 e em 1873/4 adquiriu a casa "Fotografia Fritz", estúdio fotográfico na Rua do Almada, nº 122, Porto, que veio a dar origem ao seu segundo estabelecimento a “E. Biel & C.ª” (1890), no Palácio do Bolhão, nº 342 da Rua Formosa. Na sua múltipla atividade comercial e industrial, que inicialmente se iniciou por uma fábrica de botões, Biel foi também responsável por algumas redes de eletrificação sendo também o empresário responsável pelos Caminhos de Ferro de Vila Real e pelas estações de Lisboa e Porto. Em 1882, com o apoio do engenheiro Cândido Celestino Xavier Cordeiro (1884-1904), a Casa Biel inicia a documentação da expansão do Caminho de Ferro do Douro, da qual se pode ver a sequência da construção da Ponte D. Luís nesta exposição. [M.M.]


Fotografias comemorativas

Os acontecimentos oficiais ou efemérides relacionados com a família Real foram, desde o início, um estímulo à fotografia que pela sua natureza testemunhal permitia colecionar registos para a posteridade. Alguns desses acontecimentos, como a chegada de D. Maria Sabóia (D. Maria Pia) para o seu casamento com D. Luis I, o engalanamento do Terreiro do Paço para a ocasião ou as comemorações do Tricentenário de Camões, são apenas alguns exemplos desta relação estreita que se desenha entre acontecimento, monumento, memória e fotografia. O Álbum deste Tricentenário, da autoria do fotógrafo Henrique Nunes (1820-1882) é um excelente exemplo dessa relação, visível na seleção dos objetos nele inseridos, tais como: as fotografias do “Carro triumphal representando a Guerra”, o “Carro Triunfal das Colónias”, ou o “Monumento a Luís de Camões”. [M.M.]


Joaquim Possidónio Narciso da Silva (1806-1896)

Arquiteto da Casa Real e arqueólogo, que estudou e trabalhou em França e Itália entre 1821 e 1834, realizou um levantamento exaustivo de edifícios e monumentos de Portugal, bem como de sítios de importância arqueológica, que publicou na Revista Pittoresca e Descriptiva de Portugal entre 1861 e 1862. Esse levantamento foi publicado em fascículos a partir de 1861 e editado inicialmente por Ernesto Augusto da Silva, com imagens realizadas em papel salgado e coladas em cartolinas com esquadria decorativa. Joaquim Possidónio da Silva foi também um dos fundadores da REAL ASSOCIAÇÃO DOS ARCHITECTOS CIVIS E ARCHEOLOGOS PORTUGUEZES em 1863, que publicava um boletim, o Archivo de Arquitectura Civil, onde se editaram imagens do próprio. [M.M.]


Wenceslau Cifka (1813-1883)

Pintor, desenhador, litógrafo, ceramista, colecionador de arte e fotógrafo terá vindo para Portugal a convite de D. Fernando de Saxe-Coburgo, em 1836, como consultor de Arte. Foi um dos pioneiros a instalar um estúdio para retratos de daguerreótipo, na Rua das Necessidades e nele dava Lições de Photographia, tendo tido discípulos como Carlos Relvas e João Paulo Cordeiro Júnior, industrial de tabaco. Em 1851, na EXPOSIÇÃO PHILANTROPICA no Arsenal da Marinha, expôs Onze quadros a Daguerreótipo, tendo também experimentado outras técnicas e feito uma especialização em Paris. Tornou-se fotógrafo da Casa Real. Após uma viagem pela Europa, juntamente com o Rei, ambos reforçaram o seu gosto pela cerâmica e foi a esta última arte que Cifka passou a dedicar-se quase exclusivamente. [M.M.]


Fotografia Estereoscópica

Uma das invenções mais populares, sobretudo a partir da sua industrialização nos anos 50 do século XIX, foi a fotografia estereoscópica. A estereoscopia, técnica inventada por Charles Wheatstone (1802-1875), em 1838, consiste na produção de duas imagens idênticas com um ligeiro desfasamento entre elas e que, quando observadas através de um visor com lentes apropriadas, proporcionam uma imagem com efeito de profundidade, hoje dito efeito “3D”. Em Portugal, a sua popularidade foi também muito grande, como o atestam as coleções existentes quer em instituições quer em colecionadores privados. Carlos Relvas (1838-1894), Aurélio da Paz dos Reis (1862-1931) ou o naturalista açoriano Francisco Afonso Chaves (1857-1926) foram alguns dos portugueses que se entusiasmaram com esta técnica e a praticaram de forma sistemática. [M.M.]


O Contemporâneo, Sciencias, Letras, Commercio e Industria [1875-1876]

Álbum editado pelo fotógrafo francês refugiado Alfred Fillon (1825-1881), dedicado a distinguir as figuras, que se considerava, à época, relevantes do meio literário, artístico, ou do comércio e indústria da sociedade de Oitocentos. É por isso um importante documento sobre a forma como uma época seleciona as suas figuras marcantes, bem como sobre os critérios subjacentes a essa seleção. A grande novidade do “Álbum” era a inclusão destacada de um retrato da figura escolhida associando-o depois a uma extensa e elegíaca biografia. Observamos, assim, como a ideia de representação identitária é indissociável da representação da aparência física, num século onde o naturalismo e a consequente importância dada à observação se propagam por todo o mundo ocidental. [M.M.]